quinta-feira, 11 de junho de 2009

SENTIMENTO DE ANJO

SENTIMENTO DE ANJO

Aniz Tadeu


Era uma meia-noite estranha
O ímpeto da paixão
Invadiu-me a alma
Seja alma pura ou imaculada
Porém currada com carradas de pavor
Saí fora de meu corpo
Como em astral viagem clandestina
Num só golpe
Atraquei-me feito vapor em cais conhecido
Porto fingido
Como estivador caído de músculos cansados
O cérebro fatigado pelas lembranças
- Que lembranças poderia ter?
- Ser eternamente poder ou força?
- Que lembranças poderiam acometer-me?
- Lembranças fugidias de homem e menina-moça?
Tempo fazia que tal fato passara
Mas a memória crua e cruel o revivera
Tempo que penso em ser uma só cara
Dada ao carrasco vil e megera

Era uma meia-noite estranha
O ímpeto da paixão
Invadiu-me a alma
Levando-a a ti, imaculada ou pura
Carregada com carradas de amor

Era só uma meia-noite estranha
Era só um estivador caído de músculos cansados
Eram só lembranças fugidias de homem
Era só uma meia-noite, tamanha era a noite
Era um sorriso que não sorria
Uma luz não luzente
Um órgão não soado
Instrumento vibratório e cardíaco
Um anjo que sente um sentimento angelical
Uma nudez casta e castigada
Um anjo mascarado
Uma máscara de fato
Triste mágoa
Profunda água de afogado
Era uma asa de penas de pena
Outra borboleta de cores de dores
Era um sorriso feito sensível
Dentro do peito e dos lábios
Era uma luz, luzidia luz
Brilhava e fervilhava em sonhos
Olhos abertos com órgão fechado
Fugidia emoção em fugidio olhar
Era um anjo sem igual
Pronto a voar entre nuvens e artérias
Eram veias quentes em pranto semente
Sangue carmim e lacrimal
Era um anjo sem igual
Era um sentimento de anjo
Era só um anjo sem igual
Passível de vida e amor
Passível de felicidade e desatino
E desatino... e desatino... e desatino
Era uma meia-noite, tamanha era a noite

VEM

VEM

Vem
mas vem plena de carícias
com todas as malícias
e todos os desejos
que todo homem quer

Vem
vem feito mulher
com todas as vidas
ora vividas e convividas
ora amadas ou corroídas

Vem
mas vem sem pré-conceitos
plena no amor de teus anseios
paixão entre teus seios
com todas as vestes desvestidas

Vem
mas vem para mim
com teu cheiro de capim
teu perfume de querubim
com as asas depenadas

Vem
vem feito mulher amada
feito fogo-ensolarada
fazer da vida vida velada
com tua boca à minha colada

Vem
vem desnuda em pele
muda na cama escolhida
jogando o corpo-sexo lida
em meu corpo que o suor expele

Vem
mas vem com fome de devorar
eu homem a te enroscar
entre coxas a me engolir
calada a boca só pra sentir

Vem
mas vem para não sair
lado a lado com o carinho
sentindo bem devagarinho
meu corpo ao teu se fundir

segunda-feira, 1 de junho de 2009

MOSTRA "ARTE NA FÓRMULA 1" - Obra "ASSÈNZA INTERROTTA" - Hotel Transamérica - São Paulo - 2008 - crítica de Oscar d'Ambrósio


Sincronia de Tempos


Estamos acostumados no Ocidente a pensar o tempo de maneira linear, com começo, meio e fim. Isso provém de toda uma tradição judaico-cristã, em que o mundo é criado, passa por transformações e tem o seu fim anunciado. Já no Oriente, há a imanência, ou seja, o tempo simplesmente existe e as ações e forças nele convivem.

O trabalho em acrílica e pastel sobre tela de Aniz Tadeu, como o proprio título (Ausência Interrompida) já aponta justamente para essa relatividade do tempo. As milenares montanhas colocam-se majestosas como um marco de resistência ao tempo, enquanto as construções evocam o saber reunido pela humanidade.

De um lado, a natureza. Do outro, a mão humana. Em meio a esse universo, sob os arcos, surge o carro de Fórmula 1, índice da velocidade de um tempo no qual cada vez se pensa menos e se vive sob a égide de um fazer contínuo que muitas vezes ignora as tradições e o passado em nome de soluções imediatas.

Aniz Tadeu promove o diálogo entre passado e presente. Sua imagem estimula pensar como a tradição de um esporte não é feita repentinamente, masa é construída ao longo do tempo, principalmente quando se tem uma visão que não considera a vida como algo linear, mas como um viver simultâneo de experiências históricas.


Oscar D’Ambrosio, jornalista e mestre em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Unesp, integra a Associação Internacional de Críticos de Arte (AICA- Seção Brasil).